Foto de 1969 [http://lucnog1.blogspot.com]
SÉRGIO ALBUQUERQUE
( Pernambuco – Brasil )
(1946-2008)
Sérgio Moacir de Albuquerque - poeta, artista plástico, antropólogo e funcionário público.
Murais da Morte surge [em 1968] de acordo com a linha da Geração 65 , no que concerne ao domínio formal e o cultivo de uma certa aspereza cabralina, quer de temática, quer de despojamento retórico, na busca do avesso do lugar comum e da mesmice que caracterizava o poeta diplomata do Recife. (...)
Quando este livro foi publicado, Sérgio Moacir de Albuquerque tinha 22 anos e atuava na cidade do Recife como belo e precoce Rimbaud nordestino. LUCILA NOGUEIRA
CANTOS DA DEFINITIVA PRIMAVERA
(III)
Às vezes pegava minha flauta
como Anphion sobre o deserto
e acompanhava o canto matinal das aves
improvisando
entre as descargas dos automóveis
então um manto de areia
me envolvia
asas compunham um ritmo
quase africano de atabaques
e descobria riachos
nascendo por trás dos muros
ou no teto
onde não brincavam moscas
e me afastava
em cada som emitido
sonorizado
aterrorizado
ante uma possível guerra
fugindo de uma morte mitológica
atento às mínimas palavras
de qualquer desconhecido
tentando decodificar
e analisar
mensagens esparsas
de conversas cotidianas
consultando nuvens
em busca de possíveis cogumelos
passando os dedos
em tuas coxas firmes
afastando a angústia
em teu sexo caliente
analisando teus sonhos
e gestos mais obscuros
profetizando futuras desgraças
devidas à besteira dos homens
que só pensam em dinheiro
mesmo que custe a vida
de todo o planeta
dos assassinos
da produção em massa
e do lucro
dos destrutores
do equilíbrio das florestas
e dos peixes
dos homens – cifrões
desprovidos de qualquer sensibilidade
diante de coisa puramente humanas
sequiosos de poderio
de moedas que não sabem usar.
Então me tentavas acalmar
afirmavas teu amor
e a decadência inevitável do Sistema
provocada por suas próprias contradições
o renascimento do Homem sábio
e a inviabilidade de uma guerra nuclear
o alcance de uma consciência
cada vez mais ampla
sabotando todo o sistema destrutivo
gradativamente
e me recontavas
estórias de ursos frustrados
porque queriam tornar-se estrelas de cinema
em Hollywood.
(De Cantos de Definitiva Primavera, 1998)
*
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Página publicada em maio de 2022
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